Wednesday, May 25, 2016

Algumas reflexões sobre as dificuldades no retorno ao trabalho

Algumas reflexões sobre as dificuldades no retorno ao trabalho

5 ALGUMAS REFLEXÕES SOBRE AS DIFICULDADES NO RETORNO AO TRABALHO
O princípio básico para a elaboração de um programa de retorno ao trabalho é ampliar o conceito de
capacidade laborativa: todos podem contribuir em um processo de trabalho. Cada caso deverá ser avaliado na sua
particularidade. O programa deve evitar que o trabalhador fique excluído no próprio local de trabalho.

Estudos recentes têm demonstrado que, na maioria das situações laborais, o trabalhador elabora estratégias
defensivas que lhe permite conviver com o risco e com o sofrimento. Com o afastamento do trabalho, essas estratégias
são abaladas e o indivíduo fica liberado daquele funcionamento psíquico construído, em alguns casos, ao longo de
anos. O trabalhador se vê diante daquilo que ele temia e que se esforçou em negar, juntamente com os colegas: o
trabalho causa ou causou a doença. Afastado do trabalho, pode decorrer que o paciente adote uma atitude positiva, a
de encontrar-se consigo mesmo e de aprender a cuidar de si. Pode ser, também, que ele construa ressentimentos ao
constatar que um colega que errava mais do que ele ou que tinha uma produtividade menor do que a sua está ocupando
o seu antigo posto. O sentimento de ser insubstituível se desvanece, dando lugar ao sentimento de não-reconhecimento
pelo seu passado profissional. Em alguns casos, pode ocorrer que a situação de adoecimento não tenha se modificado
durante o período de afastamento, levando ao adoecimento de outros colegas.

Os coletivos de trabalho são fundamentais para o equilíbrio da pessoa no seu ambiente profissional.
Quando o indivíduo se afasta do trabalho, ele perde o vínculo com os membros deste coletivo, o que pode agravar a fragilização
provocada pela constatação de que aquela atividade provocou seu adoecimento. Ao retornar ao trabalho, pode ocorrer
que as modificações feitas no ambiente, na tentativa de adaptá-lo às suas condições físicas atuais, interfiram na
eboração dos mecanismos coletivos de defesa. Também é possível que ele encontre resistência de parte dos colegas
no reconhecimento de sua doença.
Várias piadas e insinuações permeiam o cotidiano do reabilitado, como, por exemplo,
“você está com boa aparência”, “como foram as férias?” ou comentários evocando uma simulação de doença.
O retorno ao trabalho pode ser visto como uma ameaça pelos que ainda não adoeceram.
Em outros casos, podem surgir ressentimentos pelo sentimento de sentir-se
“como batata quente que é jogada para lá e para cá”, decorrente da situação vivida no
cotidiano com as perícias, relatórios, filas, comentários de
vizinhos e amigos, que não entendem como uma doença invisível pode gerar afastamento. O paciente se esforça para
dar visibilidade à doença, tentando provar sua existência por meio de exames complementares positivos, pelo uso do
splint ou de relatórios médicos. A experiência vivida como trabalhador afastado por LER/DORT altera sua identidade
como trabalhador, e o insucesso de um programa de retorno ao trabalho pode ser explicado pelo contexto de vida
durante o afastamento e a realidade que ele encontra ao voltar.
O sucesso de um programa de retorno ao trabalho depende das medidas efetivas tomadas pelo empregador
para corrigir a situação que originou a doença e das possibilidades que o indivíduo tem ou teve para extrair dessa
experiência elementos positivos para a sua identidade enquanto sujeito e cidadão.

O fluxograma apresentado no Quadro XXIX aponta alguns aspectos pouco valorizados na abordagem médica
e enfatiza a importância de modificações nas condições e nos ambientes de trabalho. O encarregado do atendimento ao
trabalhador deve estar atento a essas situações e solicitar o auxílio, quando necessário, de serviços de referência em
saúde do trabalhador, dos órgãos de vigilância sanitária, do MTE, do MS, do MPAS e do Ministério Público, na perspectiva
de solucionar a questão.
Os conflitos relacionados ao retorno ao trabalho são de especial importância. É fundamental a adoção de
programas de prevenção e retorno ao trabalho que estimulem a permanência do lesionado no trabalho em atividades
diferentes da que exercia anteriormente e identifiquem listas de atividades leves e alternativas que possam facilitar o
retorno dos afastados no mais breve espaço de tempo.
Ranney (1997) chama a atenção para o que denomina de odisséia psicológica da dúvida e do desespero,
desenvolvida pelo trabalhador sadio, que, após desenvolvimento de lesão, ausenta-se do trabalho e evolui com quadro
de dor e incapacidade, culminando com sua auto-identificação como inválido. A equipe de atendimento deve evitar
condutas que reforcem essa trajetória, como o prolongamento desnecessário de afastamentos, preparando-se para a
abordagem dos fatores psicossociais que acompanham esses casos.
Para viabilizar a permanência e/ou o retorno ao trabalho dos trabalhadores que apresentam manifestações
dolorosas e limitações de movimentos, devem ser incentivados:
- o aumento do controle real das tarefas por parte daqueles que as realizam;
- o aumento da participação real e efetiva dos trabalhadores nos processos decisórios da empresa;
- o enriquecimento das tarefas, eliminando atividades monótonas, repetitivas e horas extras;
- o estímulo do sentimento de que pertencem e/ou de que fazem parte de um grupo;
- o desenvolvimento de uma relação de confiança entre trabalhadores e demais integrantes do grupo,
inclusive superiores hierárquicos;
- o aumento do sentimento de responsabilidade;
- o desenvolvimento de práticas gerenciais de suporte aos trabalhadores, inclusive lesionados, de modo
a facilitar a adesão dos trabalhadores a programas de retorno ao trabalho.

A construção de ambientes de trabalho saudáveis tem sido apontada como uma alternativa de programa
para a prevenção de LER/DORT e um facilitador para o retorno de lesionados ao trabalho.
As inúmeras dificuldades que envolvem o manejo de LER/DORT somente serão superadas à medida que
os distintos atores sociais envolvidos adotarem uma postura desarmada e respeitosa para lidar com os diferentes
olhares, interesses e limites intrínsecos à questão.


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